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Próximo Encontro

XII Reunião Científica da ABRACE - São João del-Rei, Minas Gerais.

O que podem as artes cênicas entre a máquina do mundo e as lutas pela terra?

A Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-graduação em Artes Cênicas (ABRACE) retorna às Minas Gerais no ano do centenário da incursão modernista às cidades históricas (1924) entretanto, no caso da Associação, nos encontraremos em São João del-Rei, na Reunião Científica em 2024, e em Ouro Preto, no Congresso em 2025, tendo como ponto de partida temático o poema “A máquina do mundo”, de Carlos Drummond de Andrade, publicado originalmente em Claro enigma (1951), para pensarmos sobre o poder das artes cênicas frente ao avanço da máquina mundial sob o planeta e em defesa das lutas justas pela terra. A ideia pré-moderna da máquina do mundo enquanto metáfora das engrenagens que movem o universo e a nós seres terrestres remonta da Antiguidade ao Renascimento. Neste sentido, a ideia comporta uma larga memória do mundo como máquina que acaba agenciada, em tom irônico-sentimental, pelo poeta mineiro a partir do eu lírico que caminha por uma estrada de Minas. O poeta começa seu itinerário palmilhando vagamente uma estrada pedregosa de Minas quando, num relance, “a máquina do mundo se entreabriu”, para quem dela se esquivava, no “fecho da tarde de um sino rouco”. Ela convidava a todos para se “aplicarem sobre o pasto inédito/da natureza mítica das coisas”, ao domínio sobre os recursos da terra, e as paixões e os impulsos e os tormentos, tudo o que define o ser terrestre ou se prolonga até nos animais e chega nas plantas. A oferta implica não apenas o domínio sobre todas as coisas também o saber de tudo que define o ser terrestre vislumbrados, é claro, segundo o despertar do “sono rancoroso dos minérios que dá volta ao mundo e torna a se engolfar na estranha ordem geométrica de tudo”. Diante de semelhante graça, o poeta baixa os olhos desdenhando colher a oferta que se abria ao seu engenho, pois a treva mais estrita já pousara sobre a estrada. Mesmo rechaçada, a máquina volta a se recompor, miudamente, deixando o poeta de mãos pensas.

O trabalho possui uma vasta fortuna crítica e é considerado um dos mais importantes da obra do poeta mineiro. Dentre outras contribuições, destacamos a de José Miguel Wisnik que analisou, em a Maquinação do mundo: Drummond e a mineração (2018), a relação entre a composição do poema e a expansão do mundo como máquina ligados a escalada técnico-mundializante, capitaneada pela mineração, após a Segunda Guerra Mundial (2018). O crítico salientou que “a promessa de explicação totalizante”, “de cunho regressivo e pré-moderno”, “autoritário e mistificador”, mesmo sem correspondência  com o ânimo” “que move esse sujeito insatisfeito e moderno”, não deveria ser menosprezada dada a descrição fulgurante da máquina do mundo que, por sua vez, segundo Wisnik, concentra a cifra histórica e metafisica do poema se considerarmos a magnitude do entorno da mineração e “a chegada da máquina mundializante a Itabira” (2018, pp. 189-190). Mas, além dessa cifra histórica e metafisica mencionada que atravessa o poema, é preciso lembrar da sua intertextualidade, já salientada pela fortuna crítica, com Os Lusíadas de Camões, pois, assim, podemos estender o arco temporal do caminho do poeta à conquista e à colonização europeia do mundo, sobretudo se tivermos em mente que a graça irradiada pela máquina nos lembra do providencialismo associado à atividade colonizadora e ou mineradora portuguesa marcada, muitas vezes, pela oferta divina das terras conquistadas. Deste modo, as lutas pela terra aqui compreendem um leque amplo de sentidos, agentes e contextos relacionados aos processos de libertação e de descolonização de nações e povos, as diversas formas de resistência empregadas por quilombolas, indígenas, ribeirinhos, militantes sem-terra, que, até hoje, buscam o reconhecimento de seus direitos aos territórios que habitam ou já habitaram como, também, outros modos de conceber a terra/mundo que alteram o valor das forças que nos movem e as variadas práticas de combate sublevações, revoltas, motins, ocupações, levantes, dentre outras maneiras de fazer frente ao avanço da máquina ecoando as veredas das Gerais.

Sendo assim, a recusa do poeta (ou suas mãos pensas) nos serve como ponto de partida crítico para pensarmos, a partir das estradas pedregosas de Minas hoje, sobre o poder das artes cênicas situado entre a máquina do mundo e as lutas pela terra, em suas inflexões sociais, políticas e culturais tecidas ao longo do tempo, se pensarmos que num mesmo corpo que vivemos a experiência da degradação dos ecossistemas, as desigualdades globais de variadas ordens e as inúmeras discriminações políticas.

Logo, o evento deste ano – a XII Reunião Científica da ABRACE –, na cidade de São João del-Rei, Minas Gerais, abrigado pela UFSJ, considera, não como exclusivos, mas como emblemáticos, alguns momentos a serem lembrados e celebrados nesse ano de 2024, na elaboração de nosso encontro deste ano. Há 90 anos, em 1934, firmaram-se os primeiros direitos constitucionais concedidos aos indígenas no Brasil. Os artigos 5º e 129º da Constituição abordavam a integração dos povos indígenas na sociedade nacional e resguardavam a posse de suas terras, proibindo sua alienação. Há 80 anos era fundado o Teatro Experimental do Negro, em 1944, de valor indispensável no conjunto da atuação e da luta de figuras fundamentais de nossa história cultural e teatral como Abdias do Nascimento, Tomás Santa Rosa, Ruth de Souza, dentre outros, nos processos de valoração e reparação da história afro-brasileira e de valor indispensável para nossa cultura contra hegemônica. Além disso, celebramos os 70 anos da formação da primeira liga camponesa brasileira, em 1954, e os 40 anos do I Encontro
Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que deu origem ao MST, em 1984. surge da necessidade de pensarmos mais detidamente sobre a reflexão teoria e a prática das artes cênicas num contexto mundializado tensionado pelas forças da máquina do mundo em contraponto àquelas que movem as lutas pela terra, considerando alguns momentos a serem lembrados e celebrados nesse ano de 2024. Há 90 anos, em 1934, firmaram-se os primeiros direitos constitucionais concedidos aos indígenas no Brasil. Os artigos 5º e 129º da Constituição abordavam a integração dos povos indígenas na sociedade nacional e resguardavam a posse de suas terras, proibindo sua alienação. Há 80 anos era fundado o Teatro Experimental do Negro, em 1944, de valor indispensável no conjunto da atuação e da luta de figuras fundamentais de nossa história cultural e teatral como Abdias do Nascimento, Tomás Santa Rosa, Ruth de Souza, dentre outros, nos processos de valoração e reparação da história afro-brasileira e de valor indispensável para nossa cultura contra hegemônica. Além disso, celebramos os 70 anos da formação da primeira liga camponesa brasileira, em 1954, e os 40 anos do I Encontro
Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que deu origem ao MST, em 1984. À partir destas memórias, e muitas outras que deverão e poderão ser invocadas, convidamos a todas, todos e todes à pensarmos juntos em São João del-Rei, Minas Gerais, em setembro, sobre a prática das artes cênicas num contexto mundializado tensionado pelas forças da máquina do mundo em contraponto àquelas que movem as lutas pela terra buscando reconhecer, dentro e ou fora da área, as tendências principais desse panorama crítico do tema, a partir das diversas frentes de trabalho do evento, Grupos de Trabalho e de Pesquisa, Fóruns, Mesas e Conferências, segundo as diferentes perspectivas apresentadas pelos convidados e convidadas, pelos associados e associadas, a fim de prepararmos um grande Congresso em 2025 na cidade de Ouro Preto, na UFOP.

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